Concertos UFRJ: Wagner 200 anos

A edição desta semana de Concertos UFRJ homenageia Richard Wagner – compositor alemão cujo bicentenário de nascimento se comemora este ano. Embora sua produção inclua lieders (canções), sonatas para piano, sinfonias, um poema sinfônico, entre outras experiências, foi na ópera, ou drama musical como preferia chamar, que se desenvolveu plenamente sua capacidade artística inovadora. Com Wagner, a linguagem e a própria concepção do gênero, sua função e o papel do compositor na música sofrerão uma profunda transformação que impactará as gerações seguintes.

 

Wagner nasceu no dia 22 de maio de 1813 em Leipzig, no leste da Alemanha. Desde criança tomou gosto pelas artes. Além da música, apreciava o teatro e a literatura, artes que o acompanharam por toda a vida. Autodidata em larga medida, começou a estudar piano e contraponto aos 11 anos.

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Ouça aqui o programa: 

Toda segunda-feira, às 22h, tem "Concertos UFRJ" na Roquette Pinto FM. Sintonize 94,1 ou acompanhe pela internet!

Programas anteriores podem ser encontrados na seção Concertos UFRJ.

 

Cursou a Faculdade de Música de Leipzig, um dos principais centros musicais da época, mas abandonou-a antes de se formar.

Foi nesta época que começou a compor seus primeiros trabalhos em ópera. Entretanto, Die Feen (As Fadas), de 1833-1834, Das Liebesverbot (A proibição de amar), de 1835-1836, foram malsucedidos e praticamente não são mais montados. A seguir veio Rienzi, escrita entre 1838 e 1840. A obra retornou à cena ao longo do séc. XX e sua abertura é eventualmente ouvida em concertos sinfônicos.

 

Mas a primeira ópera do compositor que entrou para o repertório e estabeleceu sua reputação como grande criador foi Der fliegende Holländer (O Holandês Voador; ou Le Vaisseau Fantôme, O Navio Fantasma), que estreou em Dresden em 1843. Ópera em três atos, ambientada em uma aldeia da Noruega, conta a história de um navegador holandês que, punido por blasfemar contra Deus, se vê condenado a vagar pelos sete mares até encontrar o amor verdadeiro e uma mulher que lhe seja plenamente fiel. Desta obra, o programa apresentou a famosa abertura, na interpretação da Orquestra Filarmônica de Viena e regência de Karl Böhm.

 

Outra abertura muito executada em concertos é a de Tannhäuser, estreada também em Dresden em 1845. Tannhäuser é uma ópera que adota ainda a divisão tradicional em árias e conjuntos. A interpretação veiculada foi novamente a da Orquestra Filarmônica de Viena conduzida por Karl Böhm.

 

Além de compositor, Wagner foi autor de extensa obra literária, a começar pelos libretos de suas óperas, que ele mesmo escrevia, e considerava poemas. Suas ideias estéticas o colocam entre os maiores teóricos de todos os tempos. Wagner acreditava que a pintura, a música e a poesia haviam alcançado o limite de suas evoluções e que, para inovar, seria necessário combinar essas linguagens em uma Gesamtkunstwerk - o conceito de obra de arte total, ou integral, apresentado pela primeira vez no artigo “Arte e Revolução”, de 1849. Apenas a ópera, em sua opinião, seria capaz de almejar esse ideal.

 

Foto: Reprodução
bayreuth
O teatro construído pelo compositor na Colina Verde (Grüner Hügel), também chamada de "Colina Sagrada" pelos wagnerianos.

Outro elemento adotado por Wagner, ainda que não inteiramente original, foi leitmotiv, ou motivo condutor, que detalhou no texto “Ópera e drama”, de 1850. Um elemento musical recorrente, como um acorde ou uma melodia, associado a determinado personagem ou situação dramática. Wagner usou o leitmotiv pela primeira vez em Der fliegende Holländer e em todas as suas óperas posteriores.

 

O seu mais ambicioso projeto, o ciclo de quatro óperas baseadas na mitologia germânica que compõem o ciclo de Der Ring des Nibelungen (O Anel do Nibelungo) está impregnado destes conceitos. Composto por Das Rheingold (O Ouro do Reno) (1853-1854), Die Walküre (A Valquíria) (1854-1856), Siegfried (1856-1857 e 1864-1871) e Götterdämmerung (Crepúsculo dos Deuses) (1869-1874), levou vinte e seis anos para ser completado e requer, no total, cerca de quinze horas para ser executado.

 

Essas ideias estéticas exigiram um novo espaço cênico para se desenvolverem, o famoso Bayreuth Festspielhaus (Teatro do Festival de Bayreuth), construído especialmente para encenar suas obras. Em sua inauguração, em 1876, realizou-se a primeira apresentação integral de O Anel. Wagner tomou como base um projeto do grande arquiteto Gottfried Semper, originalmente proposto para uma sala de ópera em Munique. A construção foi possível mediante uma doação generosa do rei Luís II da Baviera, protetor e mecenas de Wagner.

 

O teatro tem excelente acústica e capacidade para quase dois mil lugares. Sua mais conhecida peculiaridade é o fosso coberto que torna a orquestra invisível ao público. Uma ideia do próprio Wagner, para que os espectadores prestassem atenção apenas ao drama que se desenrolava no palco, sem se distrair com os movimentos do maestro e dos músicos.

 

Foi porém com Tristan und Isolde (Tristão e Isolda), composta entre 1857 e 1859 e baseada em uma lenda medieval narrada por Gottfried Von Strassburg, que Wagner levou mais longe suas ideias revolucionárias. O chamado Acorde de Tristão, logo nos primeiros compassos da obra, resume seu conteúdo dramático e, sem função harmônica tonal claramente definida, radicaliza tendências presentes no romantismo do século XIX. Com ele Wagner abala definitivamente os alicerces de quase três séculos de música e prepara a transgressão seguinte. A dissolução da tonalidade pelo cromatismo em Tristão e Isolda dará impulso às pesquisas dos compositores da Escola de Viena (Schoenberg, Berg e Webern) e de outros no século XX.

 

Com a interpretação da Orquestra Estatal de Dresden (Staatskapelle Dresden), da qual, aliás, Wagner foi regente titular a edição apresentou este famoso Prelúdio e, a seguir, a “Morte de Amor”, da mesma ópera. A gravação tem o maestro Giuseppe Sinopoli à frente da orquestra e conta como a soprano Cheryl Studer.

 

Finalizou o programa, a conhecida “Cavalgada das Valquírias”, do terceiro ato de Die Walküre (A Valquíria). A obra foi estreada em 1870 e que constitui a segunda parte de sua tetralogia.

 

Wagner faleceu no auge da fama em 13 de fevereiro de 1883, na cidade de Veneza, devido a problemas cardíacos. “Triste, triste, triste. Wagner é morto!”, lamentou o compositor italiano Giuseppe Verdi, considerado por muitos como seu antípoda estético e cujos 200 anos de nascimento também são comemorados em 2013. Foi enterrado em Bayreuth, em um túmulo construído no jardim se sua residência.

 

Após a morte de um grande músico, sua biográfica e opiniões costumam perder importância, ofuscadas pela grandeza de sua obra. Não foi o caso de Wagner. O espectro de seu nacionalismo foi apropriado (e distorcido) pelo nazismo nos anos 30 do século passado. Idolatrado por Hitler, o compositor foi convertido em expressão do verdadeiro espírito do Terceiro Reich e exemplo da superioridade do intelecto germânico, com as consequências trágicas que todos conhecemos.

 

Não parece possível ainda dissociar Wagner desses acontecimentos, nem de seu antissemitismo, expresso por exemplo no opúsculo de 1850, Das Judenthum in der Musik (O judaísmo na música), em que ataca Meyerbeer e Mendelssohn. Talvez por muito tempo nossa recepção do compositor permaneça, em larga medida, condicionada por eles.

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O programa radiofônico Concertos UFRJ, resultado de um convênio da UFRJ com a Roquette Pinto, vai ao ar toda segunda-feira, às 22h, na sintonia 94.1 FM. Apresentado por André Cardoso, regente titular da OSUFRJ, as edições podem ser acompanhadas on line ou por meio do podcast (áudio sob demanda) da Roquette Pinto (FM 94,1).

 

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