176 ANOS FORMANDO MÚSICOS DE EXCELÊNCIA

Cavaquinho: da música popular à orquestra sinfônica

Em 2011 foi criado na UFRJ o Curso de Bacharelado em Cavaquinho. Desde então, Henrique Cazes, referência no instrumento há quase quatro décadas, é professor deste primeiro curso do instrumento em nível universitário em nosso país. O trabalho que realizou com a Camerata Carioca, liderada pelo bandolinista Joel Nascimento em parceria direta com Radamés Gnattali, se caracterizou pela composição de arranjos camerísticos para a música popular. Com os luthiers Mário Jorge Passos e Tércio Ribeiro criou soluções técnicas para a manufatura do instrumento que aperfeiçoaram o som e a resistência da estrutura física do cavaquinho. Como mestre do instrumento criou a Escola Moderna do Cavaquinho.

 

 Foto: Divulgação
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Qual a importância da criação do primeiro curso de cavaquinho em nível universitário no Brasil?
HC – Diferente do bandolim que na cultura musical erudita sempre encontrou lugar, o cavaquinho, até a criação do curso na Escola de Música, possuía uma trajetória que se confundia com a música popular urbana do Brasil. Por isso penso que o bacharelado será um divisor de águas. A importância do curso reside no fato de formar cavaquinistas no mais alto nível, aptos para todo tipo de trabalho, isto é, desde fazer um acompanhamento na música popular até tocar junto a uma orquestra sinfônica. As novas obras compostas pelos docentes compositores da Escola de Música não apenas inserem o cavaquinho no terreno da música de câmara, como também inauguram uma literatura nova na música erudita, além de representar uma quebra no paradigma de ligar o cavaquinho apenas ao samba e choro.

 

Instrumento de origem portuguesa, você costuma dizer que o cavaquinho atingiu no Brasil seu mais alto grau de desenvolvimento. Pode falar sobre isso?
HC – A cidade de Braga, no Norte de Portugal, é reconhecida como o berço do cavaquinho, onde lá o instrumento é chamado de "Braguinha", ou seja, pequena viola de Braga. De lá o instrumento se espalhou por Portugal e por seus territórios ultramarinos (Ilha da Madeira, Açores) e colônias, como o Brasil, África Portuguesa, Goa (Índia) e Macau (China). Foi levado também para lugares onde os portugueses tinham postos comerciais como Havaí e Jacarta, na Indonésia. No Havaí foi rebatizado de ukulele que significa em havaiano "pulga que salta". Mas de todos os lugares, foi no Brasil que atingiu um grau maior de desenvolvimento, justamente por ser usado em gêneros como o samba e choro, que desde a década de 1930 representam oportunidades de profissionalização. E aqui tivemos Waldir Azevedo, que revelou as possibilidades do instrumento como solista, fazendo muito sucesso e influenciando várias gerações. Qual é o estilo brasileiro de se tocar cavaquinho? Como se caracteriza? Este estilo já está presente em outros países? O bacharelado será importante para difundi- lo?
HC – O cavaquinho brasileiro abriga muitos estilos que se desenvolveram através dos tempos, acompanhando as mudanças no jeito de se tocar nossa música popular. Na área do samba, por exemplo, existem estilistas marcantes como Paulinho da Viola e Alceu Maia, que utilizam formas totalmente distintas de palhetada. Na área de solo existem também diferentes escolas e estilos. O curso de bacharelado em cavaquinho será importante pelas razões anteriormente expostas e para inventariar estilos, preservá-los e difundi-los. Quanto ao interesse pelo estilo brasileiro de se tocar cavaquinho, afirmo que tem crescido muito fora do Brasil. Posso ilustrar a afirmativa, dizendo que, em uma turma de um curso de cavaquinho que ministrei na Casa do Brasil da Universidade de Paris, em 2005, dos doze alunos, apenas um era brasileiro. E na música de concerto? Pode comentar sobre o repertório do instrumento e sua presença nela?
HC – Além da Camerata Carioca, que além de choro tocava de Vivaldi a Leo Brouwer, havia a Orquestra de Cordas Brasileiras e a Camerata Brasil, nas quais o cavaquinho foi usado em experiências camerísticas ainda mais arrojadas. Mas, como instrumento solista, só a partir do curso de bacharelado e das obras dos compositores desta Escola de Música, como Ernani Aguiar, Alexandre Schubert e Carlos Almada, que o cavaquinho ganha um repertório de música de concerto. Que repercussões a nova habilitação em nível superior pode trazer para a música de concerto, para o ensino e para a musicologia?
HC - Sempre acreditei num futuro de evolução para o cavaquinho, na ampliação de suas possibilidades de utilização tanto como solista como em grupos de câmera. Quando lancei o método "Escola Moderna do Cavaquinho" em 1988, muitos achavam que o livro não seria adotado por não trazer, por exemplo, tablaturas e sim notação em pauta. Eu dizia na época e o tempo demonstrou ser verdade, que estava surgindo uma geração de cavaquinistas dispostos a estudar música. Hoje temos aqui no Rio, pelo menos dez cavaquinistas arranjadores e o meu livro está caminhando para a 12º edição com mais de 35.000 cópias vendidas. Penso que a habilitação em nível superior vai atrair para a universidade um contingente de músicos muito ativo no circuito de samba e choro, possibilitando mais diálogo entre o mundo acadêmico e essa realidade de nossa música popular. Esse diálogo pode gerar frutos valiosos nos campos da educação musical e da musicologia.

Fale um pouco sobre os aspectos musicais do concerto
São três movimentos. O primeiro, adota a forma sonata, com a apresentação de dois temas distintos, alternados entre órgão e orquestra. Depois surge o desenvolvimento individual de cada deles e, por fim, a justaposição e contraponto entre ambos. Segue a reexposição do tema inicial e a conclusão com escala de tons inteiros. Dos três movimentos é o que apresenta maior equilíbrio entre órgão e orquestra.

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